terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Agora eu vou sonhar



“Agora eu vou sonhar
Eu vou sonhar a verdade
E vou pedir a Deus
Que o sonho não me despedace”


Titãs – Agora eu vou sonhar


O que diriam os profetas, pais de santo, cartomantes?
O que diriam os amantes?

Flor de Lótus se abriu, e em abril as flores se abrem para enfeitar a primavera, mas isso é lá no hemisfério norte, aqui no sul, é a fase da mudança de roupagem...
Troca das flores, das folhas, dos sabores...
Troca de saberes...
Saberei caminhar pelos vales profundos?!

Não...
Isso é uma metáfora de luz, não de trevas
Então entregue suas armas e sinta a relva macia

Estação de mudanças...
Dispa-se, despeça-se...
Peça o que pode oferecer...
Ofereça o pão, a mão...

Sonhe como na canção, e sonhe de verdade
Mas não despedace o coração!

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Sorriso de neném


“Pode me abraçar sem medo
Pode encostar sua mão na minha”

_ Ei!

Foi assim que começou o diálogo, e ele abriu um sorriso gigante, com quatro dentes, dois em baixo e dois em cima, suas “garrinhas”, e aquela boquinha pequena e toda babada, e veio cambaleando pro meu lado, as perninhas pequenininhas e trôpegas.
Ele não sabe falar nada, deve ter no máximo um ano de idade, mas aquele olhar curioso e aquele sorriso escancarado fazem do pequeno desconhecido um poço de curiosidades!!!
Como pode?
Uma coisinha tão pequena e desengonçada
Atrapalhado nas vontades de transpor o próprio mundo
Ele deu dois passos sem a ajuda de ninguém e caiu sentado, e riu largamente, gostosamente
Tentou começar de novo, mas a gravidade foi lá e... pof!
Ele me olhou, virou de lado e começou tudo de novo, aí estendi a mão pra ele, ele sorriu de novo.
“Pelos céus!!! Pare de sorrir” Pensei...
“Assim vou acabar querendo te morder todo”

Mas por que morder?
Por que a gente gosta de morder criança?!

Quando eu estou com fome, mordo o pão que sacia minha fome
Quando vejo criança, tenho vontade de morder, pra me encher de vida, e saciar o medo do tempo...
Para a criança, o tempo está só começando...
E se eu me alimentasse de toda aquela felicidade descomprometida?
E se eu me saciasse de alegria, de sorrisos, de felicidade?!

Bom, não é bem assim que funciona, e ele foi embora, com aqueles olhinhos de jabuticaba olhando para trás, por cima do ombro da mãe.
Eu acenei, ele sorriu mais uma vez, derretendo meu coração que se encheu de vida, e de repente me dei conta de que a vida acontece, também, em uma sala de espera!

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Um gole de café...



“Sempre, quase sempre indo em frente
Sempre quase rente passa
Gente sempre quer mudar


Nunca, quase nunca
Sempre numa saia arapuca justa
A gente nunca sabe onde chegar”


Sempre numa saia justa,
Onde a gente quer chegar?!

Enfim, os rumos, são infinitos!
Mundo de possibilidades

‘Hei! Sirva-me um café, que não seja forte o suficiente para tirar-me o sono, mas que não seja fraco a ponto de não ter sabor!’

É tempo de olhos abertos e ouvidos atentos,
O intento é não entediar-se
O intento é corresponder às expectativas
O intento é ter, ter para onde correr...
Ter teto, ter chão, ter chama, ter carne, ter cama!
O intento é tentar...
Mais uma vez e sempre mais...
O intento é trilhar!
Caminhar, cavalgar, rastejar...
O intento é chegar!

‘Hei! Traga-me agora um cigarro, uma vela e um pedaço de papel: vou botar fogo no mundo!’
 
...
 

Amanheceu!
Mais uma vez na saia justa, arapuca...
Armadilhas que a vida nos traz!

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Só para os amigos do rei

Vou-me Embora pra Pasárgada
Manuel Bandeira
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Texto extraído do livro "Bandeira a Vida Inteira", Editora Alumbramento – Rio de Janeiro, 1986, pág. 90

Em frente

 

Contemplo da minha varanda o mundo lá fora, e concluo:
O mundo é muito vasto para minhas aspirações!
Eu aqui, insensata imaginando saber de tudo, e a cada passo, a cada canto, descubro que há cantos e encantos jamais imaginados!
O belo dessa reflexão é o simples fato de expandir...
Acho que é isso que finda a ideia dos universos em expansão que já me enlouqueceram em física quântica: as possibilidades de conhecimento e descobertas são infinitas...
Aí voltou à brincadeira que guardei na gaveta há muitooo tempo (e é hora de começar a brincar de novo) = o mundo deve crescer, pra fora e pra dentro
A gente dispõe de infinitas possibilidades de descobertas externas e internas
E o mais belo de tudo é admirar!

Engraçado, não me lembrava da última vez que tinha visto a chuva, visto mesmo, sabe? Com os olhos da alma, não com os olhos congestionados de uma pedestre que tem que se desdobrar embaixo de um guarda-chuva reclamando da lama nos sapatos...

E a lama ainda lembra outra coisa: lambuzar!!!
Isso lembra brigadeiro de panela e seção de cinema, e lembra que tem muito filme bom que se encontra apenas na lista de filmes a serem vistos, e que ainda não foram...

Olhar e ver que o horizonte é mais amplo, e infinitamente mais belo do que aquilo que a gente vê apenas ao redor dos pés...
É uma dádiva!!!
Erguer os olhos, esse é o lema!
Não olhar nem para baixo, nem para o alto, mas olhar em frente!!

Dia feliz! =)

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

A primeira coisa que existiu



Foi essa semana, mais precisamente antes de ontem, a frase foi simples:
_Menina, troque estes óculos, você não está enxergando direito!

Nessa hora a gente para, faz cara de paisagem, lança um sorriso amarelo, do tipo, você tem razão, e depois vai embora, com um circo de pulgas atrás da orelha... na verdade, dentro da orelha, porque elas, as pulgas, ficaram saltitando dentro da cabeça, fazendo peripécias mil...

Então é simples assim? Eu troco os óculos e vejo tudo direito!

Quanta coisa acontece debaixo do nosso nariz, na frente dos nossos olhos, debaixo das nossas asas e saias?! E é simples assim!
Então, enquanto estava perambulando pelos meus labirintos mentais, buscando óculos que sejam mais eficientes e ao mesmo tempo estilosos, pensei:
Chico Buarque...
Por isso ele construiu um pouco desse espaço, é que pra pensar eu preciso de barulho, e a música ajuda bastante...
Citações (estão causando polêmicas atualmente), mas acho que é do Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes: “antes de existir a voz existia o silêncio”...
Nesse tempo eu não pensava, por que o pensamento é uma voz que fala dentro de mim, e ela não cala...
Mas agora eu sei: vou lançar um óculos que tenha de fato a minha cara, e parar de querer ver coisas onde não existem, e parar!!!

Parei, estou de altas!!!
Folhinha verde!
Qual é, a vida é simples assim!

Construção

Deus Lhe Pague

Chico Buarque

Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer, e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague
Pelo prazer de chorar e pelo "estamos aí"
Pela piada no bar e o futebol pra aplaudir
Um crime pra comentar e um samba pra distrair
Deus lhe pague
Por essa praia, essa saia, pelas mulheres daqui
O amor malfeito depressa, fazer a barba e partir
Pelo domingo que é lindo, novela, missa e gibi
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça, desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes, pingentes, que a gente tem que cair
Deus lhe pague
Por mais um dia, agonia, pra suportar e assistir
Pelo rangido dos dentes, pela cidade a zunir
E pelo grito demente que nos ajuda a fugir
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas-bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir
Deus lhe pague

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Deus lhe pague!

Construção

Chico Buarque

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado
Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague